quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Os dias que nos falaremos pelos poemas
Não acabarão jamais...

LMD

O PULSO

E porque insiste em tentar vendar meus olhos?
Não tem vergonha de buscar desculpas, respostas, motivos quaisquer? 
Pra dizer que és vago, que és farsante, que não tens memória nem glória.
Onde está a cabeça elevada de lombo doído, moída das horas sem fim?
Onde está o pulso que dói, e por doer se levanta sem pena, com garra e sem dó de ninguém?
Ele não está só. O corpo das costas cansadas, com os filhos no colo, com filhos com fome.
Onde tu estás? Me fazes levantar e diz completar, honestamente, minha renda?
Teus poucos centavos a mais? Não sou piada.
Não luto pelas migalhas, eu luto no luto que parece eterno.
Mentira encarnada, encrustada na pele, vermelho pintado, vermelho sem sangue.
Tomei teu café, escutei tua história e ainda em delírio confiei na tua trama.
Na cama mal feita, na cama de gato deitei e sonhei.
Mas acordo e meu vermelho é real, manchará tua alva invenção.
O pulso não está só, derramará teu sangue, e vencerá.

LMD
2014 

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

SIMPLES TRISTEZA

Nem as rosas tem perfume na partida
Turvo e confuso esse mundo de inversão
Meus passos nãos tem pressa, não tem peso
Os dias se sobrepões e eu continuo imóvel
Nem rastro, nem resto, nem rama
Os olhos abertos não veem
Sem sentido, sem sentir

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

DUREZA

Pra ser inteiro
Não sei caminho
Não tem roteiro a descoberta
Nem lagarta, nem borboleta
Sou vento sem forma, sem cor
Vago, rodo, giro, e volto
Beijo todos os corpos
Toco teus pensamentos
Mas você não compreende
A dureza de ser amorfa
Sem trabalho, sem salário
Sem futuro, só tormento.


LUIZA MATTOS

sábado, 26 de julho de 2014

O FIM DO AFAGO

Se um dia eu não fosse mais nada
Se um dia eu não fosse mais sonho
Se fosse esquecida no tempo
Se não houvesse mais corpo 
Se nada mais me saísse das ventas
Aí então, não haveria mais drama
Ai então, não haveria desejo
E, sem medo nem zelo
Sem cuidado e sem pudor
Minha morte teria chegado
Minha pele se encontraria enrijecida sob a terra fria
E minhas mãos não mais serviriam para afagar

Recife 
Julho, 2014

terça-feira, 6 de maio de 2014

SOBRE O MEDO SUBTO DA PERDA

Eu gostaria de saber como ficarei sem as cartas se um dia elas se forem.
Como ficarei sem as notícias irrelevantes sobre o tempo que preenchem meus dias.
O amor que se transformou em amizade e em mais amor, assim quase sem querer.
Não posso pensar que um dia ficarei sem notícias das minhas pequenas que se acompanham.
Uma mais serelepe do que a outra, uma mais cheia de vida e mais teimosa do que a outra.
São extremamente lindas as minhas pequenas, e eu as amo tanto.

terça-feira, 25 de março de 2014

BURACO

Perdi a vontade do som.
Perdi a vontade da voz.
Perdi motivo e sentido.
Eu não encontrei saída.
Mas avistei buraco.
Virei o coelho branco.
Virei Alice.

LMD
Recife

quarta-feira, 19 de março de 2014

Papo de Parada


- Você é de artes?
- Não, mas pretendo. No momento sou arteira. 
  Quem sabe um dia serei artista!

LMD
10/03/2014
Recife

SOBRAS DA NOITE

No tempo um buraco
No peito tormento
As mesmas horas
O mesmo pesar
A rua escura e sem som
Caindo, migrando e não sendo.

Triste brilho do real
Feiura que perde o velo
Estômago que perde voz
Desaba o mal feito
Desfeito o feitiço

Sobra um troço torto
Um rosto sem cor
Um vão sem fim
Ao cabo de tudo...
O resto de mim.

Luiza Mattos
10 de Março de 2014
Recife

PROPOSTA

Cafuné,
Conversa,
E café.

Que tal?

 LMD
Recife
05/02/2014

ESPERA

Você esperando o ônibus e eu esperando você.
Nessa noite somente o tempo é nosso inimigo.

LMD
Recife
18 de Março de 2014

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

O QUARTO AO LADO

      As noites e os dias se repetem, e é como se não tivessem mais fim. Um gole de vinho não me faz relaxar, nem uma garrafa inteira. As lágrimas rolam pelas maçãs do rosto e deixam meus olhos ardendo pela manhã. Faz calor aqui. O ventilador não para. Um dia ensolarado depois de uma noite infernal. E isso tudo outra vez. Mais uma vez. Sem motivo para tanto eu abro os olhos, mas preferia continuar dormindo. O banho frio acorda os nervos que já estavam tensos ao levantar da cama. As olheiras agora me acompanham e o corretivo debaixo dos olhos passou a ser obrigatório. Escrevo com o se pudesse fugir do barulho que a chave do quarto ao lado fará quando abrir. Naquele quarto está o repouso, o trabalho, o descanso e a realização. Neste aqui? Aqui a máquina continua silenciosa, e as duas primeiras frases ficaram perdidas no papel, sem continuidade.

                                                        ...........................................

      Cheguei ao fim do dia. O corredor tem vida própria. Antes do entardecer muitas portas se abriram e se fecharam. A cada movimento lá fora uma dor minúscula lembra-me da solidão dos dias passados e futuros. A coisa toda parece ancorar na loucura, e essa tênue linha é cruzada a cada passo dado sobre as lajotas vermelhas. Fechei os olhos e senti o cheiro do café que entrava pelas frestas da janela. Acompanho a vida ao meu redor através dos cheiros e ruídos que escapam aos cuidados de seus produtores. Estamos habituados a ambientes assépticos e nos esforçamos a cada movimento para sermos invisíveis no que nos aproxima de nosso estado animalesco. Gostaríamos de mascarar nossos cheiros, nosso suor, cansaço, nosso sofrimento. As fotos felizes publicadas no universo virtual em que nos afundamos, enlameados de imagens, sons e palavras alienantes, cumprem este papel. Na virtualidade não existe fedor, nem exaustão.
     Recebi as chaves do quarto ao lado no meio da noite, por debaixo da porta. Do envelope pingaram palavras de escrita apressada, ensoparam o assoalho da sala e me deixaram ilhada. Meus pés estavam agora fixos, presos ao chão. Eu estava bloqueada.